quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

TROPA DE ELITE: O INIMIGO É OUTRO?

O filme que estreou uma semana depois das eleições para governador e presidente esse ano quebrou novamente recordes de bilheteria. Segundo anunciou ontem o Jornal Nacional, foram 10.736.995 milhões de pessoas que assistiram ao filme, o que faz Tropa de Elite ocupar o lugar de filme mais visto no Brasil, título que foi de “Dona Flor e seus dois maridos” durante os últimos 34 anos.

Não vamos falar da fama do filme, das produções e propriedades cinematográficas, mas de alguns significados narrados pelo filme que nos incomodam. Em particular, a pergunta que não quis calar foi: os inimigos do Capitão Nascimento eram outros ou mais dos mesmos?

A narrativa do filme demonstra o Estado do Rio de Janeiro envolvido com um dito “novo inimigo”, as milícias policiais, que invadem as favelas para controlar o poder econômico do tráfico de drogas. O filme nos chama atenção para uma mudança na história do crime organizado no Rio? Para quem não conhece a história da violência no estado do Rio de Janeiro pode ser que isso seja realmente uma grande novidade (o que acreditamos em chute que seja mais de 70% do público que assistiu e aplaudiu o filme no cinema).

Mas não é essa a nossa realidade. A milícia podia até não ter a fama, o reconhecimento público, mas ela já agia fardada dentro das favelas. Desde a primeira edição de Tropa de Elite, já havíamos visto a participação ativa da corrupção policial no tráfico.

O silêncio foi propagado durante meses. As comunidades do estado do Rio estavam caladas em seus becos, as milícias (que antes eram apenas reconhecidas como os “justiceiros” das chacinas na Baixada Fluminense) pareciam estar quietos, controlados pela pacificação ativa do estado. Era assim que a mídia pregava o lugar das UPPs e um possível fim da atuação de bandidos na cidade, especialmente, na Zona Sul, onde a paz clamada finalmente havia chegado.

Balela, filme. Não demorou muito para a realidade vir com frieza e surpreender os espectadores de Tropa de Elite que acreditaram no fim do “vilão traficante” e sua substituição pelo “vilão miliciano”. E quando vimos os homens fugindo da Vila Cruzeiro através do vídeo da Rede Globo nos perguntamos: ué, os traficantes existem ainda? Mas a Tropa de Elite não contou que agora nossos inimigos são os militares corruptos? A mídia não nos disse que as UPPs trouxeram paz ao estado? Quase não se via mais noticias e evidencias sobre a atuação dos traficantes nas comunidades. Esse personagem não havia morrido, não teria sido desarmado?

A mídia de forma geral, especialmente aquela que fala para a classe media brasileira, tem uma enorme afinidade com as narrativas de José Padilha. Ela cria heróis como Capitão Nascimento, constrói estereótipos sobre a paz, a salvação e a violência.

O poder de ambos em silenciar e criar inimigos é o mesmo. Mais que isso, o jornalismo sonha com eventos sanguinolentos feito Tropa de Elite e não puderam se conter com as emoções de ver tanques de guerra invadindo o Complexo do Alemão, bandidos fugindo, sendo presos e mortos por uma tropa de justiceiros treinadas por um Capitão Nascimento, um homem estudado, de família, digno de enquadrar no beco os seus inimigos.

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